quinta-feira, 10 de junho de 2010

Educação transnacional universitária, uma perspectiva

Se buscarmos as análises econômicas para o setor da educação, por mais divergentes em questões pontuais, haverá unanimidade quanto à potencialidade do mercado neste século. O pesquisador português Boaventura de Souza Santos, pensando a universidade no Século XXI, discute argumentos usados por organismos internacionais para estimular a transnacionalização mercantil da educação superior. No "comércio mundial de serviços", o setor educacional passou a constituir-se nas duas últimas décadas em fatia considerável se pensado pelo viés do mercado global.

Especializada em análise de serviços financeiros, a empresa norte-americana Merril Lynch enunciava na virada do século que, mesmo gigantesco, o mercado global da educação caracterizava-se por pouca produtividade, pela busca de tecnologia apesar do baixo nível de aproveitamento tecnológico, por uma gestão pouco profissional e uma baixíssima taxa de capitalização. Um mercado muito fragmentado cujo potencial de investimentos depende de novas áreas de valorização.

Há um modelo econômico pensado a partir do modo de vida dos países centrais em que, na concepção de Boaventura, as estratégias sociais de organização focam-se na necessidade de qualificação para o domínio das tecnologias. A chamada "sociedade da informação" é a base dessas estratégias. Neste contexto, as desigualdades sociais não estão em pauta. O uso das ferramentas para acesso à "economia do conhecimento" parte do princípio de que o direito a elas é livre, independente das oportunidades construídas coletivamente.

O "capital humano" é o motor dessa economia. Aptidões e capacidades cognitivas precisam ser trabalhadas para dar à informação um uso criativo e eficiente, colocá-la a serviço de "processos de reciclagem" exigidos por essa economia. Em outras palavras, é de formação permanente que ela precisa. O termo não pode ser confundido: uma coisa é formação, capacitação permanente para os lugares de ocupação dessa economia; a outra é educação permanente, um processo muito mais amplo de formação que põe essas aptidões e capacidades cognitivas sob o crivo de avaliações socioculturais e científico-tecnológicas mais responsáveis.

A saída para a desfragmentação desse gigantesco mercado, segundo os organismos internacionais de financiamento, depende de uma transnacionalização dos processos educativos; uma rede tecnológica capaz de transferir know how e formar capital humano através das tecnologias da informação e da comunicação, diz Boaventura. Contudo, essa estrutura pode também ser usada com o intuito de aproximar diferenças, construir oportunidades coletivas e acessíveis, sustentar projetos locais de desenvolvimento e criar políticas sociais de sustentabilidade.

As universidades, pelas características já enfatizadas aqui, têm "competência instalada" para usar as ferramentas de transnacionalização do processo educacional numa direção menos mercantilizada e para compor uma rede de múltiplos saberes capazes de mobilizar recursos cognitivos, estéticos e ético-morais no sentido de superar as desigualdades. Neste aspecto, Boaventura defende um novo modelo de conhecimento cujo "princípio organizador de sua produção é a aplicação que lhe pode ser dada". Um caminho interessante para a recomposição dos critérios que hoje sustentam cursos de nível superior e seus programas de pesquisa e extensão.

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