sexta-feira, 7 de novembro de 2008

O lugar da universidade (1)

"Horário nobre", emissora “líder de audiência” em TV. Por 60 segundos, a universidade se mostra como objeto de desejo; como o lugar certo para um futuro desejável. Belas imagens (quase todas sem relação com o ambiente universitário), música aconchegante, a mensagem é um convite ao sonho. Vista ainda como lugar das elites, dos privilegiados, dos intelectuais, a universidade se configura numa miragem. Não é o lugar em que os saberes convergem, criam, dão sentido ao mundo; mas o lugar de garantias quanto à ascensão social e ao sucesso no mundo do trabalho. Estereótipo contemporâneo dos mitos modernos.

Sobram vagas; as Instituições de Ensino Superior entraram definitivamente no mundo competitivo. Segundo o Censo do Ensino Superior, divulgado anualmente pelo Ministério da Educação, 44,9 % do total de matrículas não foram efetivadas no Brasil em 2006. Isso representa quase 1.200.0000 vagas não preenchidas. Há, de um lado, a alta seletividade do ensino gratuito; de outro, o alto custo das mensalidades em instituições pagas. Nos níveis de aprendizagem que antecedem o ensino de terceiro grau, os índices de qualidade são baixíssimos e os de evasão, altíssimos. O país mantém sua demanda por educação reprimida entre a incapacidade intelectual e a econômica. Mais adiante, menos de 50% dos que se tornam capazes de ascender ao ensino de terceiro grau concluem seu curso no tempo previsto.

O antropólogo francês Marc Augé mensura o estágio atual da modernidade pelo excesso de informações, de imagens e de individualismo. O excesso de informações fragmenta nossa percepção de contexto; o de imagens impõe a percepção de que parece não haver outra realidade além do que elas mostram; e o de individualismo, pautado pelo consumo, dilui as mediações institucionais em detrimento dos meios de comunicação. Um lugar com estas características é destituído de identidade, não oferece possibilidade de relações siginifcativas e não tem história. Para o antropólogo, um não-lugar.

Nos posicionemos, então, diante da TV no "horário nobre", por 60 segundos que sejam, e incorporemos o indivíduo que sonha com uma vaga no ensino de terceiro grau. Não há contexto na mensagem comercial; a universidade posta na tela é uma ficção e as vagas que ela oferece concorrem com quaisquer objetos de desejo para consumo. Não há imaginário pior para uma instituição de ensino: ser substituída pela sua pseudo-representação. Não há imaginário pior para uma universidade: destituída de identidade, desvalorizada em suas experiências significativas e sua história; feita um não-lugar.