quarta-feira, 1 de outubro de 2008

Polêmica posta em pauta. De novo!

Obrigatoriedade do diploma de Jornalismo: a recorrência a esse tema vem justamente das discussões sobre as decisões judiciais. Parece que só vale a pena discutir o assunto quando o diploma está em risco. Enquanto não se fizer uma discussão séria sobre o tema, estaremos sempre "pondo em pauta" (como na mais clássica visão de redação) a polêmica sobre quem está melhor preparado para ocupar postos no mundo do trabalho. Postos que, via de regra, reproduzem o mais vil dos discursos sobre a nossa sociedade: descontextualizado e autoritário (paradoxalmente aos anseios de democracia).

Um jornalismo que não se liberte das tecnologias como justificativa para uma produção de "qualidade", que não se sustente no rigor da apuração (como a ciência nos exige), não proponha uma expressividade mais sensível e criativa (como a arte nos sugere) e que não se envolva com os temas relevantes para a contemporaneidade deve mesmo ficar restrito a certificados de formação. Talvez Muniz Sodré nos dê uma pista sobre a essência desse debate. O diploma é o símbolo de um processo de formação (hoje reconhecido no campo da educação e no mundo do trabalho como permanente) com prazo de validade. Aliás, em muitos casos, quando chega a ser emoldurado seu prazo de validade já venceu. Quero dizer com isso que certificar um jornalista hoje, assinar embaixo de uma trajetória de formação e chancelar seu ingresso no "mercado de trabalho" tem muito pouco a ver com o papel que simboliza o fim de uma etapa desse processo.

Isso, claro, é válido em todas as profissões. Mas talvez não se possa fazer essa discussão sem envolver outros tipos de formação no campo da comunicação. Se é de um lugar de ocupação que estamos falando, o jornalismo deve respeitar outros lugares de ocupação nesse campo. Não vejo discussões sobre o fato de jornalistas estarem ocupando postos de trabalho de publicitários, relações públicas ou cineastas. E quando essas especificidades são "invadidas" pelo jornalismo (sobretudo quando não há postos de trabalho para todos os "diplomados"), que posição assumir? Essa discussão deve ficar no interior de cada especificidade do campo da comunicação? É possível identificar essas especificidades como fronteira? Se há jornalistas ocupando esses postos não regulamentados, isso já não evidencia uma suposta competência para além das fronteiras?

Se, por um lado, há um compromisso de "classe" para com a "qualidade" na formação, por outro, supõe-se que a sobrevivência dos cursos superiores de jornalismo depende disso. Consideremos, então, que os padrões de qualidade profissional podem ser comparados aos padrões de avaliação estabelecidos por uma comissão de especialistas, composta pelo MEC para mensurar a "qualidade" do ensino de jornalismo no país. Há aí uma imposição; a mesma que determina os padrões técnicos de produção. Escolas homogêneas, dominadas por um discurso hegemônico a respeito de como deve ser a formação.

O foco da discussão deve sair do lugar de ocupação e passar, definitivamente, para o processo de formação. O lugar de ocupação do jornalista não condiz necessariamente com o lugar de ocupação do jornalismo. O jornalista está alocado no mundo do trabalho como mão-de-obra (via de regra barata); o jornalismo, na sociedade, como atividade que sustenta o processo democrático nas relações de poder. Na visão clássica, passa, portanto, pela ocupação consciente dos postos de trabalho disponíveis nos meios de comunicação de massa a luta pela liberdade de imprensa e a mediação responsável entre as esferas de poder e a sociedade (sempre interpretada como ignorante e desinformada). É preciso, contudo, aprofundarmos os conceitos de "mediação", "consciência", "responsabilidade" e "liberdade" (só para começar!); e discutir, sem hipocrisias, o "futuro" dos meios de comunicação. O diploma que defendemos diz mais respeito ao ensino das coisas úteis a profissão ou ao ensino sobre a profissão propriamente dita (a pergunta é de Gabriel Garcia Marquez)? O jornalismo deve mesmo se libertar das epistemologias de onde subjaz e enveredar por seus campos idiossincráticos?

Parafraseando Muniz Sodré: se é o diploma que ainda garante a formação adequada aos comunicadores, VIVA A FORMAÇÃO QUE LEVA AO DIPLOMA! Para todas as habilitações, independente dos postos de trabalho decorrentes. Discutamos o campo da comunicação e realoquemos o jornalismo como exercício intelectual de interpretação do mundo, generoso na expressividade e sensível na percepção do que nos cerca. Ou, então, continuemos nesse jogo de imputar à instrumentalização profissional a garantia de um lugar de ocupação.