sábado, 22 de agosto de 2009

Ensino superior e o "logo ali adiante" dos NÃO LUGARES


Registros em (per)curso [por Luciano Bitencourt]

Espaços de circulação, de consumo e da comunicação representam para o antropólogo Marc Augé o que ele chama de não lugares. Neles não se pode "ler, em parte ou em sua totalidade", a identidade, as relações e a história compartilhada de seus ocupantes. São lugares que apenas "autorizam, no tempo de um percurso, a coexistência de individualidades"; feitos para o conforto de um momento. Os não lugares expressam as tensões solitárias dos deslocamentos sem compromisso com o próprio espaço.

Há uma relação contratual entre os "passantes" e esses espaços, a partir de símbolos que legitimam o movimento. Mesmo junto com outros, os "passantes" estão sempre sós na busca de objetos de desejo para satisfação própria. Autoestradas e aeroportos enquanto espaços de circulação; supermercados e hotéis enquanto espaços de consumo; telas e cabos enquanto espaços da comunicação, todos expressam a metáfora dos não lugares. Mas o próprio Augé adverte que a definição destes espaços depende de quem os ocupa. Significa dizer que há espaços elaborados para um determinado fim que foram transformados por um sentido de ocupação despreocupado com os objetivos de origem.

No ensino superior, pode-se reconhecer, a metáfora dos não lugares também está presente. As perspectivas de diminuição de carga horária para encurtar a estada num curso superior, por exemplo, são um indicativo. Os cursos precisam oferecer passagem rápida para o que interessa: o ingresso no mercado de trabalho. Há, igualmente, um sentido de carreira que obriga o deslocamento rumo a títulos para legitimar um lugar de ocupação na estrutura acadêmica. Objetos de desejo, lugares de ocupação no mercado de trabalho ou na estrutura acadêmica dependem dos símbolos de uma relação contratual com "passantes": certificações, diplomas, títulos...

Os não lugares acadêmicos parecem ser estruturados pela falta de compromisso com o ambiente em que se inscrevem. Não há um sentido de construção coletiva, a não ser em pequenos nichos ou guetos. Não há multivocalidade no espaço que ainda se desenha como centro de produção de conhecimentos. E essa é, por princípio, a concepção de não lugar: nele "não há". O espaço das utopias, da percepção de potencialidades, do devir, esse espaço social de aprendizagens anda impregnado de "tensões solitárias", passagens efêmeras para o "logo ali adiante", seja ele qual for.

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