segunda-feira, 1 de novembro de 2010

Convergência de recursos e os possíveis disponíveis para o Jornalismo

Pedro Kuhnen (foto), da RBS de Florianópolis, falava na "Noite de Comunicação" sobre as potencialidades do twitter para o Jornalismo. Conversa informal, puxada a partir de ideias levantadas por trabalho monográfico em que ele, Pedro, é fonte de entrevista. Falávamos sobre a possibilidade de os posts no twitter servirem de pauta para os jornalistas e de "manchete" para notícias personalizadas, encontradas nos diversos pontos da rede e socializadas em função de interesses e escolhas individuais. Não houve tempo para aprofundamento. A conversa foi rápida mas inspiradora. Tentemos estendê-la.

Na sociedade contemporânea, já dissemos, o lugar do Jornalismo pede novos espaçamentos cognitivos, estéticos e ético-morais. O que isso significa? Alertam os especialistas que formataram a proposta para as novas diretrizes curriculares em debate: os valores democráticos na atualidade fundamentam-se pelas "armas da linguagem" e através dos "suportes tecnológicos". E é pelo Jornalismo, dizem, que os sujeitos agem discursivamente no e sobre o mundo. Neste sentido, cumpre à atividade assumir "uma linguagem narrativa e uma eficácia argumentativa" no espaço público. Até aqui, nada de novo. Não há outros possíveis disponíveis.

Novos espaçamentos cognitivos, no entanto, situam o Jornalismo como ação mediadora num contexto hoje inusitado. Professores da Universidade de Columbia já falam em formar gestores de comunidades sociais. A concepção aponta para a possibilidade de um exercício intelectual de interpretação do mundo dentro das próprias redes. Uma ação para além de capacidades discursivas, portanto. Jornalistas passarão a ser também os meios, não só arautos de mensagens informativas. Nessa perspectiva, as redes sociais são entendidas como "grande manancial do conhecimento" e a produção de notícias tende a ser mais colaborativa. Jornalistas são percebidos como "curadores de notícias", aglutinadores de informações.

"Mídias interativas" têm sido ferramenta para simulações de aprendizagem nas mais diversas áreas. Também no Jornalismo. Jogos eletrônicos baseados em conflitos mundiais adotam a atividade jornalística como mote; um reforço à ideia de que os valores democráticos necessitam de "guardiões". O importante, contudo, é que estes jogos inscrevem o exercício intelectual de interpretação do mundo na capacidade de mobilização de recursos para a produção de textos sobre temáticas específicas. Não a circunscrevem, portanto, à simples capacidade discursiva.

Diante de um quadro cujas possibilidades ganham exponencial abertura, os espaçamentos estéticos modificam-se de maneira relevante. Fala-se muito hoje em convergência. Os argumentos dão ênfase às mídias, aos modelos econômicos sobre os quais as informações são produzidas e através das quais circulam; reforçam também a circularidade discursiva a respeito dos "fenômenos" midiatizados numa espiral que recria aspectos do cotidiano e inspira interpretações descontextualizadas, afastadas da origem. A concepção de convergência, portanto, diz respeito aos meios expressivos em razão dos meios econômicos.

Novas formas de expressão surgem de habilidades relacionadas à convergência de 
recursos. O ofício jornalístico também merece atenção quanto à sua arte expressiva.

Há outras formas de perceber a convergência para além da miopia a serviço de uma economia que congrega entretenimento, informação e publicidade. Jornalistas têm à disposição ferramentas que reúnem todos os recursos técnicos necessários para, minimamente, exercer a atividade. Não apenas no que tange à produção, mas também quanto à veiculação de informações consideradas relevantes. Essa convergência de recursos talvez seja mais importante que a aglutinação de meios expressivos. Isso porque inverte a lógica do processo: da concentração de meios em relação a diversidade de recursos para a concentração de recursos em relação a diversidade de meios. Julgam alguns estudiosos que as notícias serão personalizadas no futuro; reconheçamos, não tão distante assim.

Espaçamentos ético-morais merecem também reavaliação. Informações instantâneas não nos chegam mais ao vivo; elas estão online. Essa característica é significativa uma vez que tais informações compõem uma espécie de inteligência coletiva, estão organizadas numa prótese de memória sempre disponível quando necessária; não são mais fugazes, não se perdem no tempo. A instantaneidade não pode, contudo, ser relacionada simplesmente aos discursos imediatos sobre acontecimentos, no caso do Jornalismo. Estar online é também estar nesse mundo instantâneo, é também fazer parte dele num contexto político de defesa dos valores democráticos.

Vamos esclarecer: a defesa dos valores democráticos aqui não é simplesmente assumir um discurso de contrapoderes. Se as redes sociais são a bola da vez e a convergência de recursos abre caminho para múltiplos canais de mercado e modos de produção, os valores democráticos inscrevem-se na comunicação como locus de produção cultural, de relações sociais e de desenvolvimento humano. Não haverá mais espaço para meros prestadores de serviço e construtores de discurso preocupados em mediar fontes. O exercício intelectual neste contexto não comporta mais estereótipos baseados num suposto poder de autoridade e legitimidade quanto aos dizeres sobre o mundo.

Se o Jornalismo se pretende professoral, no sentido de ter no cerne de sua atividade "habilidades pedagógicas na prestação de serviços públicos", como afirmam as novas diretrizes em debate; se o Jornalismo precisa assumir a defesa da cidadania pelo viés do esclarecimento, colocando-se como fiscal dos direitos alheios; se o Jornalismo ainda põe-se a "intermediar" influências, pode-se esperar que procure fazê-lo ajudando a criar canais de comunicação e não apenas assumindo discursos esterotipados sobre os possíveis disponíveis à sociedade. O uso do twitter, tema do início de nossa conversa, é um mero detalhe.

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